O primeiro ANCAP brasileiro
Quem foi o primeiro anarcocapitalista brasileiro da história?
Os ANCAPS se acham extremamente originais ao publicarem suas ideias revolucionárias na Internet e compartilharem filósofos como se fossem deuses da realidade.
Esse é o comportamento de muitos na Internet. Falam frases como “recursos escassos” e veneram a “propriedade privada” como pontos de partida. Também vociferam por aí a “praxeologia” como ferramenta última de análise da realidade.
O tal dos “recursos escassos” é uma das enjambrações filosóficas pra justificar uma visão de mundo completamente distorcida. Eles se acham originais. Eles acham que ninguém nunca pensou nisso antes.
Ancaps, tenho que apresentar pra vocês o primeiro ANCAP da história. Já que a maioria deles só lê o site do Instituto Mises, preciso apresentar pra vocês um rapaz chamado Machado de Assis. Talvez vocês já tenham ouvido falar dele. Lembra daquele professor comuna de literatura? Certamente ele falou e tu não prestou atenção. Assim como achou que o professor de história estava te doutrinando.
Eis que o tio Machado Escreveu diversas obras. Uma delas, foi Quincas Borba. Um sucesso para a época e ainda hoje é lida como um clássico da literatura brasileira. Quincas Borba foi escrito por volta de 1890. Nesse livro, ele faz uma paródia ao cientificismo e ao evolucionismo muito presentes nos debates da época.
Pedro Rubião, ex-professor primário, torna-se, em Barbacena, enfermeiro e discípulo do filósofo Quincas Borba, que lhe apresenta o Humanitismo, em que a razão do homem é sempre buscar viver e que a sobrevivência depende muitas vezes de saber vencer os outros. Mas no que consiste o Humanitismo? Bom, nada melhor que a explicação do próprio Quincas:
“Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos que assim adquire forças para transpor a montanha e e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais feitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”.
Temos aqui o primeiro ANCAP brasileiro. A distinção clara entre perdedores e vencedores. A famosa ideia de RECURSOS ESCASSOS sendo disputados pelas pessoas. Ora, ora. O pessoal achava que o primeiro ancap do Brasil tinha sido o cara do ideias radicais no YouTube? Não. Foi Quincas Borba, um personagem fictício, em 1890.
Qual o erro do raciocínio de Borba? Batatas não são recursos escassos. Pros anarcocapitalistas que não sabem como o mundo funciona, aqui vai um tutorial:
Obviamente que Machado de Assis sempre soube disso e genialmente conseguiu criar um personagem que representa bem a maioria dos ANCAPS, mais de 100 anos antes. A genialidade do autor é o de conseguir representar um argumento errado de forma brilhante e simples. Genialidade maior ainda é conseguir tirar com a cara dos ANCAPS direto de seu túmulo.
Obrigado Machado. Se um dia te critiquei, já não lembro mais.